Estudos Camonianos

A dimensão tradicional na poesia lírica camoniana

Na lírica de Camões uma bipartição se faz evidente, à mais superficial abordagem: de um lado, os poemas da medida velha; de outro, os da medida nova. Nos primeiros se encontra a dimensão tradicional, que é o que nos cabe aqui tratar, ainda com o risco de repetir do muito já dito, pois que a matéria está longe de ser nova ou pouco explorada.

Comecemos por definir medida velha, designação que surgiu no séc. XVI - não sem certo tom pejorativo - para, em oposição a medida nova, aplicar-se aos metros e gêneros tradicionais utilizados pelos poetas do Cancioneiro Geral. Na falta de uma Arte de trovar [1] em vernáculo, como a que se tinha para o lirismo dos velhos cancioneiros galaico-portugueses, temos de socorrer-nos da Arte de poesia castellana, de Juan del Enzina, onde se diz que

Toda la fuerça de trobar está en saber y conocer los pies por que dellos se hazen las coplas y por ellos se miden, y pues assi es sepamos que cosa es pie. Pie nos es otra cosa en el trobar sino un ayuntamiento de cierto numero de silabas, y llamase pie por que por el se mide todo lo que trobamos, y sobre los tales pies corre y roda el sonido de la copla.

e logo adiante:

[...] los latinos llaman verso a lo que nosotros llamamos pie: y nosotros po-dremos llamar verso adonde quiera que ay ayuntamiento de pies que comun mente llamamos copla que quiere dezir copula o ayuntamiento.

Assim, pois, ao que a medida nova chamará (como os latinos) verso, chama Enzina ; ao conjunto de pés, verso; explicitando melhor:

[...] podemos dezir que en una copla aya dos versos, assi como si es de ocho pies y va de cuatro en cuatro son dos versos, o si de nueve el un verso es de cinco y el otro de cuatro, y se es de diez puede ser el un verso de cinco é el otro de otros cinco, y assi por esta manera podemos poner otros enxemplos infinitos.

Os pés, segundo ele, são de arte real, quando têm oito sílabas, ou de arte-maior, quando têm doze sílabas ou sua equivalência. Convém esclarecer o que é esta equivalência: como se sabe, a contagem das sílabas métricas à espanhola ou à italiana se faz até à última sílaba da palavra paroxítona. Se a palavra for proparoxítona, não se conta a última, e, se oxítona, conta-se mais uma. É a isso que se refere o tratadista, quando explica:

[...] digo su equivalencia por que bien puede ser que tenga mas o menos en cantidad, mas en valor es impossible para ser el pie perfecto. [2]

Na contagem à francesa (que é a que se usa em português desde, pelo menos, o fim do século XVIII [3] ), vai-se até à sílaba tônica, tendo para nós sete sílabas o pé de arte real e onze o de arte-maior.

Enzina ainda se refere ao pé quebrado

[...] que es medio pie assi de arte real como de mayor, del arte real son cuatro silabas o su equivalencia y este suele se trobar el pie quebrado mezclado com los enteros y a las vezes passan cinco silabas por medio pie y entonces dezimos que va la una perdida assi como dixo don Jorge [4] . Como devemos. En el arte mayor quando se parten los pies y van quebrados nunca suelen mezclar se com los enteros; mas antes todos son quebrados, segun parece por muchos villancicos que ay de aquesta arte trobados. [5]

 

Na divisão em pés de arte-maior e arte real, aquele de doze (onze) sílabas e este de oito (sete), que habitualmente chamamos de redondilha maior, faltava o metro curto e gracioso - redondilha menor - de seis (cinco) sílabas, muito usado pelos poetas do séc. XV, sobre os quais teoriza Enzina. Vemos agora que ele é, originariamente, o pé quebrado do de arte-maior, passando a constituir-se em verso inteiro.

Dos pés aqui citados, Camões vai utilizar muito mais largamente a redondilha maior que a menor, numa razão de aproximadamente 5 para 1; a redondilha maior pode vir acompanhada do seu quebrado (de três sílabas, mais raramente quatro). Apenas uma vez em toda a sua lírica usará o pé de arte-maior, nas "Endechas" que se iniciam por: "[Vós] sois ua dama / Do grão merecer", de que falaremos adiante.

Antes de passar aos tipos de composição decorrentes das possibilidades de agrupar os versos, fazemos questão de lembrar a permanência dessa terminologia medieval no nordeste brasileiro, que continua a ser o repositório de nossas tradições. É Manuel Cavalcanti Proença que, com o seu invulgar saber de poesia em geral e de coisas nossas, em particular, informando que os versos da poesia popular dos folhetos nordestinos podem ter cinco, sete, dez ou onze sílabas, acrescenta:

Falamos em número de sílabas para caracterizar os metros correntes entre poetas populares, mas é preciso que se deixe claro, desde logo, que a sílaba não é unidade métrica, nem mesmo as células métricas ou pés da denominação tradicional. Em verdade os elementos que se podem considerar como unidades são o verso, os grupos de versos e a estrofe [...]

Assim é que os "versos" de quatro "pés" são as quadras, tomando-se "verso" como estrofe e "pé" como verso. Vê-se, pois, que há uma unidade simples, reconhecida pelos próprios poetas, isto é, o pé ou verso. [6]

Mas voltemos a Enzina: em seu "Capítulo VII: De los versos y coplas y de su diversidad", diz ele que quando um pé aparece sozinho, não constituindo verso e, pois, não podendo rimar, chama-se-lhe mote; se forem dois, poderá ser também mote ou vilancete (em espanhol, villancico); se forem três pés inteiros ou dois inteiros e um quebrado, será também vilancete, ficando um dos pés sem rima (lembra ele aqui que alguns poetas, que não observavam tão de perto as regras do trovar, não rimavam os dois ou os três versos citados); se forem de quatro, cinco ou seis, serão cantigas (em espanhol, canciones). [7]

Ora, o que vemos em Camões é uma preferência de tal modo insistente pelo mote, que vai à quase exclusão dos outros dois tipos: a cantiga e o vilancete. Apenas, o que ele chama de mote pode ter de um a cinco pés (de redondilha maior ou menor): o mote de dois pés é quase sempre rimado (há apenas três exceções); o de três apresenta o esquema rímico abb (uma só vez aab); no de quatro, predomina largamente o esquema abba, seguido por abab e abcb (na proporção aproximada de 2 abba para 1 abab e abcb, aparecendo uma vez abcc); o de cinco só aparece em quatro composições, três vezes com o esquema ababa e uma, abbab.

As cantigas são seis, uma delas glosada de duas maneiras: três têm quatro pés (abab, abba, abcc) duas têm três (abb), a sexta tem dois (aa), e é esta que apresenta dois grupos de voltas. E vale aqui ressaltar que esta "Cantiga velha" ("Sois fermosa e tudo tendes, / Senão que tendes os olhos verdes" [8] ), que só é recolhida na ed. de 1616, já tinha aparecido, desde 1595, em forma ligeiramente diversa e designada como "Outro [mote] alheo": "Vós, senhora, tudo tendes, / senão que tendes os olhos verdes." [9]

No Cancioneiro Geral, Camões ainda encontrou a obediência - se não total, bem acentuada - às regras de Enzina, mas praticamente as ignorou, só glosando, como vimos, seis cantigas e dois vilancetes, mas quase cem motes. O que o nosso Poeta quis conservar, parece-nos, foi o tipo de poema motivado, provocado, desenvolvido a partir de uma fórmula previamente estabelecida (por ele mesmo ou por outrem), para melhor exibir seu virtuosismo, seu domínio dos processos, para se afirmar dotado de "engenho e arte" - um par que não se dissocia sem que a obra se ressinta. Assim, a maior parte da sua lírica em medida velha se constitui de voltas ou glosas: para cem destas composições, há apenas vinte e cinco trovas, endechas, esparsas, numa razão de 4 para 1. Na verdade, são cento e vinte e seis os poemas camonianos da medida velha - sessenta e nove incluídos na ed. de Soropita (1595), mais dezenove na de Estêvão Lopes (1598),  dezesseis na de Domingos Fernandes (1616), doze na de D. Antônio Alvares da Cunha (1668) e dez na de Juromenha (1846); se acima omitimos as célebres redondilhas de "Sobre os rios", foi por nos parecerem menos facilmente classificáveis num dos dois tipos mencionados, merecendo-nos uma atenção especial. De fato, se "Sobre os rios" não se compõe, a rigor, de um mote e glosas, não deixa de ser, em seu todo e em cada uma de suas partes, a glosa do Salmo 136, e de cada um dos seus versículos, respectivamente. Assim, seria talvez lícito considerarmos este poema um tipo à parte na lírica camoniana em metros tradicionais.

Até aqui procuramos caracterizar a medida velha do segundo período medieval e nela enquadrar os poemas camonianos que a utilizam; o fazê-lo foi o primeiro passo que demos para neles apreender a dimensão tradicional. Se recuarmos mais um pouco no tempo e chegarmos ao lirismo trovadoresco, veremos que, a par de cantigas de amor, lá encontramos as cantigas de amigo, em que a mulher é que fala, dando a sua própria visão das coisas, ou é apresentada pelo poeta, como narrador de uma situação por ela vivida, podendo ela também falar. De ambos os tipos encontramos exemplos em Camões.

Em um caso ou noutro - metros e gêneros do lirismo palaciano ou gêneros do trovadoresco - estamos por enquanto no nível do significante. E neste vamos permanecer por enquanto, salientando um aspecto já bastante estudado em Camões, e no Cancioneiro Geral, a que António José Saraiva chama de "estilo engenhoso" [10] e Hernâni Cidade aponta como o aproveitamento, na arte, da "graça da sua técnica e [d]o encanto do seu ritmo para os brincos da inteligência arguta e engenhosa." [11]

Esse estilo engenhoso aparece em Portugal, como na França, no fim da Idade Média, no período de transição para o Renascimento. Os poetas desse período chamaram-se em França "grands rhétoriqueurs": preocupavam-se em cultivar a retórica e alguns sobre ela escreveram, como Pierre Fabri, autor de Grand et vray art de pleine rhéthorique (1521). Nesta obra há informações minuciosas sobre processos que encontramos na poesia portuguesa da época, como: a rima equivocada (quando forma jogo de palavras); a rima reforçada (quando as cesuras rimam entre si, o que permite ler o poema de várias maneiras). Assinala-se ainda a possibilidade de mais de uma leitura do poema: além da normal, de cima para baixo, outra, de baixo para cima, outra, ainda, verso a verso, de trás para diante. [12]

Esses processos, e outros mais, usa-os Camões com a máxima mestria. Hernâni Cidade, sempre arguto na apreensão do fato literário, ressalta no Poeta "as graças do espírito alegre e vivo", o "engenho ágil, fino, irônico, umas vezes fácil, outras complicado e retorcido, pois também havia prazer em decifrar o conceito-adivinha, feito para vaidosa fruição das inteligências mais cultas e penetrantes." [13] Embora assim valorizando esse tipo de arte virtuosística, mestre Cidade ressalta que "Camões não se deteve nesta pirotecnia dos equívocos de palavras e símbolos. Às vezes, em seus brinquedos líricos, põe sob os audaciosos e risonhos metaforismos as verdades que é costume dizer com gravidade." [14] Semelhante é o julgamento de Saraiva: "Nem sempre, porém, este exercício de engenho é um malabarismo fútil. A análise vocabular pode prestar-se a um desenvolvimento discursivo e servir de ponto de apoio a uma meditação." [15]

Ora, parece-nos que, se o Poeta consegue realizar plenamente esse jogo dos significantes, fazendo deles, em parte, o próprio significado da sua obra, pouco importa que o significado que lhe subjaz seja uma verdade grave, sirva de ponto "de apoio a uma meditação", ou não passe de episódio galante.

Já agora nos permitimos levantar uma dúvida: essa agudeza e engenho que tanto se ressaltam em Camões (e significativamente lembram o título da obra de Gracián) [16] representarão a permanência de uma tradição ou a antecipação de um momento de que ele é considerado o expoente em Portugal? Será Camões um dos últimos retóricos medievais ou um dos primeiros maneiristas portugueses?

A resposta não é pacífica, antes pode suscitar objeções; mas vamos tentá-la, principiando por conceituar o maneirismo na literatura, que Hauser define como

[...] un estilo en el que el instrumento de la representación y el medio en que ésta se mueve no son sólo medio, sino, en cierto sentido, también fin, no sólo forma, sino también contenido [...]

La Literatura del manierismo no es sólo, como toda otra, un arte vinculado a la palavra y cuyas raíces se hallan en el lenguaje, sino, además, un arte que surge del espíritu del lenguaje; un arte que no tanto aporta un contenido al lenguaje, cuanto lo extrae de él. [17] (Grifos nossos)

E é ainda Hauser que, referindo-se a expoentes do maneirismo, como Shakespeare ou Gôngora, diz que seu estilo "podrá decirse que es afectado, pero nunca es un lenguaje libresco", e assinala a "forma familiar, burlesca, mescla de pathos y persiflage, con que se expresa el poeta" [18] . Dá à metáfora [19] o papel primordial nessa literatura, pondo-lhe ao lado, quase tão importante, o concetto

[...] que viene a ser la suma de todo lo que puede entenderse por agudeza, chiste, ocurrencia, alusiones oscuras y extravagantes, y sobre todo, combinaciones paradójicas de elementos opuestos. [20]

Reconhecendo que "la literatura del manierismo se encuentra profundamente vinculada a la tradición petrarquista" [21] , o eminente sociólogo da arte mostra que

El manierismo [...] provoca una nueva complicación de la dialéctica amorosa, y oscurece el lenguaje de la lírica amorosa, que en Petrarca se había hecho relativamente claro y directo. [22]

Todas essas afirmações a respeito do maneirismo podem aplicar-se a grande parte da obra de Camões, inclusive a profunda vinculação desse movimento à tradição petrarquista que ele reveste da complicação dialética dos concetti e de outros processos inovadores.

Assim, teria Camões incluído em sua obra a dimensão tradicional da lírica medieval em seu significante - o verso de arte real e o de arte-maior, o mote, a trova, a esparsa - mas também em seu significado - o tema obsessivo do amor quase sempre irrealizado, da morte / não morte por amor, do amor "serviço" -; a dimensão contemporânea do lirismo renascentista, sob a influência direta de Petrarca, também no significante - o decassílabo, o soneto, a canção -, e no significado - as contradições do amor, o retrato idealizado da mulher amada, o neoplatonismo -; e ainda a dimensão futura do maneirismo (futura por ser ele um precursor) em que se fundem as duas experiências - do passado e do presente - na medida justa com que atinge o apuro máximo no poema brejeiro, de circunstância ou não, no poema sério em que se queixa do Fado, da ventura ou dos desconcertos do mundo, ou no ainda mais sério em que busca em Deus a única solução. Como todo artista de exceção, ele é o vate, aquele que antecipa, tornando-nos impossível apor-lhe um rótulo, pois que muitos lhe convêm e nenhum o define. E é exatamente isso que dificulta a nossa tarefa de apreender-lhe apenas a dimensão tradicional: as várias dimensões da sua obra coexistem, interpenetram-se, completam-se e raramente se podem isolar. Para limitar a nossa área, vamos ater-nos àqueles poemas que de início chamamos de poemas da medida velha e dos quais já fixamos as características externas. A eles voltamos, pois, começando pelos que revelam a influência do lirismo trovadoresco, no que este tem de mais peculiar: as cantigas de amigo.

Como dissemos atrás, estes poemas se apresentam: 1. como uma breve narrativa, onde temos da mulher apenas a visão do poeta-narrador; 2. como narrativa em que se ouve não só o narrador, mas também o personagem feminino; 3. como solilóquio ou diálogo sem resposta posto na boca da mulher, a transmitir-nos a sua visão do amor. Do primeiro tipo são, por exemplo, as cantigas que têm por mote:

Descalça vai pera a fonte

Lianor pela verdura;

Vai fermosa e não segura. [23]

ou:

Descalça vai pola neve,

Assi faz quem amor serve. [24]

ou ainda:

Se Helena apartar

Do campo seus olhos,

Nascerão abrolhos. [25]

Nas três, a figura feminina, dotada sobretudo de graça, é apresentada num quadro natural, como costumava ser a menina dos velhos cancioneiros, mas são três meninas diferentes: da que vai à fonte pela verdura, apenas sabemos que é "tão linda que o mundo espanta", que vai graciosamente vestida com a roupa "de cote" e que não vai segura; da que, também descalça, vai pisando a neve, sabemos que é "fermosa", e a conhecemos por dentro como uma das vítimas do Amor; este mergulho no coração da mulher se reflete nas oposições entre a sua delicadeza feminina e a força do seu sentimento, culminando com estes versos finais:

[...]

com todo o frio se atreve.

Vede em que fogo ferve

o triste que o amor serve.

Da Helena, nos diz o narrador que seus olhos têm poder mágico sobre a natureza; se assim é, "que fará nas vidas?" E a resposta vem naquele tom de ameno "persiflage" de que fala Hauser:

Trá-las suspendidas,

Como ervas em molhos,

Na luz de seus olhos.

de tal modo que

De cada pestana

Ua alma lhe pende.

Bem humorada, maliciosa mesmo, é a glosa ao mote: "Coifa de beirame / namorou Joane" [26] , já pertencente ao segundo tipo que estabelecemos. É ela que fala, dirigindo-se a ele, em função conativa acentuada pelo vocativo "Joane", presente em todas as coplas. Declara-lhe amor, lembra-lhe duas vezes que "Amor / se pinta despido" (da segunda vez, como último argumento), adverte-o de que os outros se riem da sua parvoíce (não esqueçamos que os Parvos do Auto da Barca do Inferno e do Velho da Horta se chamam ambos Joane); ao significado do nome parece referir-se ela por fim, sem mais recursos para convencê-lo:

Sabes de que vem

amares beirame?

Vem de ser Joane.

Nesta cantiga, o papel do narrador se resume a uma copla; não assim na que leva à fonte uma outra Lianor, a quem o Poeta apenas empresta voz para a pergunta dolorida às amigas: "Vistes lá o meu amor?" [27] , que nos lembra o "Ai Deus, e u é?" de D. Dinis.

Chamamos de diálogo sem resposta aquele em que toda a cantiga, na 1a pessoa, se dirige a uma segunda - a mãe ou o amado - que permanece muda. O mote

Irme quiero, madre,    

a aquella galera,

con el marinero

a ser marinera. [28]

dá origem a uma graciosíssima barcarola em redondilha menor, na qual é a jovem que sente os estragos do Amor, que logo se refletem no jogo verbal; na primeira copla:

Madre, si me fuere,

quiera que vó,

no lo quiero yo,

qu'el Amor lo quiere.

na segunda:

Él, que todo puede,

madre, no podrá,

pues el alma vá,

que el cuerpo se quede. (Grifos nossos)

É a princípio a repetição do verbo querer em três sentidos: inserido numa locução adverbial de lugar - de lugar ilimitado pois que abrange todos os possíveis - nela se dilui sua função verbal, embora se lhe possa atribuir um sujeito indeterminado ou até determinado em sua indeterminação: o Fado, a Ventura. Dado início ao jogo, passa logo a ser o verbo na primeira pessoa, em forma negativa - o não querer dela - e na terceira, afirmativa - o querer do Amor. Assim, a partir do jogo com o verbo propulsor do dinamismo da vida, tomado dentro da ampla área do querer do destino que a todos governa, chega-se à área individual em que predomina o querer do Amor sobre o da amante. É, pois, apresentado o Amor como uma forma de destino, ao qual não pode ela fugir. E, para acentuar a oposição com o paradoxo, quem impõe a "tirana ley" é um "niño" e "niño fiero".

Do querer passa-se ao poder; não será preciso acentuar a importância da aproximação, pois que, para impor o querer, é preciso poder e o Amor tudo pode, menos que uma alma se separe de seu corpo, sem produzir a morte. Temos de entender estes versos nos próprios domínios do Amor: a alma dela é ele que, partindo, deixa-lhe o corpo só; para reunir-se em si mesma, é preciso que vá "Con el marinero / a ser marinera."

Na cantiga alheia "Falso cavaleiro ingrato" [29] , é a ele que ela fala, assumindo a atitude que é, em geral, dele - amante não amado. Também assim se mostra ela no solilóquio "De piquena tomei amor" [30] . Em ambos, o mesmo processo de jogo de palavras e de oposições: neste, minina (ela) / minino (o Amor) / mininas (dos olhos); / dor;  Amor / desamor; crio[u]-se em mi / mata-me; por amor me perco a mim / por quem de mim perde amor; em idade tão pequena / haja tormento tamanho; naquela, eu vos mato / vós matais-me; eu vos amo / vós magoais-me.

Ainda sob a influência da lírica trovadoresca poderíamos talvez incluir o que chamaríamos, com ressalvas, cantigas de malmaridada:

Minina, não sei dizer,

vendo-vos tão acabada,

quão triste estou por vos ver

fermosa, e mal empregada. [31]

As ressalvas se devem não à situação dela, que parece a mesma, mas a que a visão é dele. Na verdadeira cantiga de malmaridada, a mulher se revelava, agredia o marido com palavras más e tentava reagir; aqui, ela permanece como está e assim o efeito que exerce sobre o amante:

[...]

matáveis, sendo solteira,

matais agora em casada,

matais de toda a maneira:

fermosa, e mal empregada.

A maioria dos outros poemas da medida velha poderia dizer-se composta de cantigas de amor; algumas seriam de escárnio (sem a violência destas). Entre estes tipos do lirismo galaico-português e Camões medeia, porém, todo o lirismo palaciano, que depurou e diversificou aquele, abrangendo-o quase todo e alargando-o. Se filiamos alguns poemas de Camões ao primeiro lirismo, foi justamente ao das cantigas de amigo, que o Cancioneiro Geral ignorou.

Na linha deste, poderíamos tripartir os poemas em: 1. poemas de amor; 2. "cousas de folgar" (em geral de circunstância) e 3. sátiras.

Nos poemas de amor (amor não correspondido) o elemento mais freqüente são os olhos, causadores da pena amorosa - os dela, porque foram vistos e não vêem; os dele, porque vêem e não são vistos, ou porque não podem ver. Pena que ele sofre e que lhe traz lágrimas aos olhos: "Se me levam ágoas, / nos olhos as levo" [32] . Uma vez ele verá lágrimas nos olhos dela:

Vi chorar uns claros olhos

Quando deles me partia.

Oh que mágoa! Oh que alegria! [33]

e só no momento em que dela se aparta. Lamentando este desconcerto, joga com as palavras e os sintagmas que o representam em sua contradição:

Não sei se f[u]i enganado

Pois me tinha defendido

Das iras de mal querido,

No mal de ser apartado.

Agora peno dobrado,

Achando no fim do dia

O princípio d'alegria. (Grifos nossos)

Caracterizados pelo brilho e poder abrasador:

De vuestros ojos centellas

que encienden pechos de hielo,

suben por el aire al cielo

y en llegando son estrellas. [34]

são-no sobretudo pela cor verde que é a cor convencional da lírica: viu-a João Garcia de Guilhade na sua senhora:

os olhos verdes que eu vi

me fazen ora andar assi. [35] ,

viu-a Petrarca em Laura. Camões segue a tradição, retomando a cor, mas brinca mais uma vez com o signo verbal: verdes é o adjetivo - a qualidade atribuída aos olhos - mas também o verbo - a ação que eles não executam, pois que não vêem (e o verbo ainda aparece em forma não homônima, mas parônima: vedes). O processo lúdico o leva a uma das suas mais plenas realizações maneiristas da medida velha, pois que cria a ambigüidade que só se percebe quando a palavra se desdobra em dois sintagmas em quiasmo (olhos verdes / verdes olhos), onde só os significantes são os mesmos:

MOTE ALHEIO

Minina dos olhos verdes,

por que me não vedes?

 

VOLTAS

Eles verdes são,

e têm por usança

na cor, esperança,                05

e nas obras, não.

Vossa condição                   

não é d'olhos verdes,

porque me não vedes.

 

Isenções a molhos               10

que eles dizem terdes,

não são d'olhos verdes,                

nem de verdes olhos.

Sirvo de giolhos,

e vós não me credes;          15

porque me não vedes? [36]

À primeira leitura, só se atribui a verdes (v. 8) o significado que lhe transmitiram os versos anteriores: é a cor da esperança, negada por não o ver ela. A segunda copla, porém, nos apresenta, no v. 12, a repetição quase total do v. 8 e, em seguida (v. 13), a sua inversão. É claro que não há aqui tautologia, mas um novo significado e uma nova função sintática. O sentidos dos versos 10-13 será: a isenção - o desinteresse, a não participação - que transparece nos olhos dela não é de olhos que dêem esperança nem de alguém que veja olhos (os dele). Só agora se percebe que no v. 8 havia a bissemia que se patenteia nos vv. 12 e 13.

São ainda os olhos verdes que motivam um outro tipo de jogo: partindo de um mote alheio "Vós, senhora, tudo tendes, / senão que tendes os olhos verdes." [37] e uma cantiga velha "Sois fermosa e tudo tendes, / Senão que tendes os olhos verdes." [38] , quase iguais (já os mencionáramos acima), o Poeta faz duas glosas diferentes. Na primeira, considerando que o azul é cor melhor, dá a primazia ao verde, porque é a dos olhos dela:

Voltas próprias

 

Dotou em vós natureza

o sumo da perfeição,

que, o que em vós é senão,

é em outras gentileza.

O verde não se despreza

que, agora que vós o tendes,

são belos os olhos verdes.

 

Ouro e azul é a milhor

cor por que a gente se perde,

mas a graça desse verde

tira a graça a toda a cor;

fica agora sendo a flor

a cor que nos olhos tendes,

porque são vossos, e verdes.

Na segunda, em voltas que se estendem por dez coplas, faz o jogo de simulação:

Ninguém vos pode tirar

[O] serdes bem assombrada,

Mas heis-me de perdoar

Que os olhos não valem nada.

Fostes mal aconselhada

Em querer que fossem verdes:

Trabalhai de os esconderdes.

 

A vossa testa é jardim

Aonde Amor se desenfada.

É branca e bem talhada,

Que parece de marfim.

Já sei, [e] quanto a mim

Isso nasce de a terdes

Tão perto dos olhos verdes.

 

Os cabelos desatados,

O mesmo Sol escurecem,

Se não que, por serem ondados,

Algum tanto desmerecem.

Mas, à fé, que, se parecem

A furto dos olhos verdes,

Não vos pese de os terdes.

 

As pestanas têm mostrado

Ser raios que abrasam vidas,

Se não foram tão compridas,

Tudo o mais era pintado.

Elas me tinham levado

Já sem o vós saberdes [39]

Se não foram os olhos verdes.

 

O mimo desse carão

Nem pôr-lhe os olhos consente;

E ser liso e transparente

Rouba todo o coração.

Inda assim achareis gente

Que lhe não pese de os verdes,

Mas não seja c'olhos verdes. [40]

 

Esse riso é composto

De quantas graças nasceram,

Senão que alguns me dixeram

Que faz covinhas no rosto. [41]

Na vontade tenho posto

Dar-vos a alma, se quiserdes,

A troco dos olhos verdes.

 

[...];

finge que aceita a inferioridade dos olhos verdes, enquanto faz o retrato dela; cada novo elemento deste contraponteia com os olhos e a ambos ele faz restrições; estas, porém, o são apenas na aparência (mais uma vez, o significante) da conjunção adversativa; na verdade não restringem, encarecem. Vejamos: o defeito da testa é ser de marfim; o dos cabelos é serem ondados; o das pestanas, serem compridas demais; o da pele do rosto, ser lisa e transparente, roubar os corações; o do riso, fazer covinhas no rosto, e assim por diante. Ora, a mais elementar homologia nos leva a concluir que

 olhos  =      testa     =  cabelos   =   pestanas   =     carão        =    riso    .etc.

verdes de marfim               ondados  compridas  liso e transp.       covinhas

porque a razão entre cada antecedente e seu conseqüente é a mesma; senão que. E, se lhe quisermos aplicar uma das propriedades das proporções, veremos mais claramente o encarecimento dos olhos, por equipará-los aos outros elementos do retrato:

  olhos  =   verdes   ou olhos =  verdes   , etc.

cabelos  ondados  riso  covinhas

Duas atitudes podiam ter os amantes no Cancioneiro Geral: cuidar ou suspirar. Os poetas se dividem em pleito que inaugura a coletânea. Para uns, o suspirar será prova de amor maior, pois é tão forte, que o amante não consegue contê-lo dentro em si. Para os outros, o amor é tão alto que não se deve revelar. Amar melhor é cuidar. Por isso diz Camões:

Mi nueva y dulce querella

es invisible à la gente;

el alma sola la siente,

que el cuerpo no es dino della. [42]

 

Sepan que me manda Amor

que de tan dulce querella

a nadie dé parte della,

porque la sienta mayor. [43] (Grifos nossos)

Os cuidados crescem com as suspeitas e os ciúmes, e o Poeta sobre eles escreve dois longos poemas: "Carta a ua dama" [44] (duzentos e dez pés) e "A uas suspeitas" [45] (noventa pés); neste, sobretudo, a intensidade da emoção confessional antecipa o pré-romântico Bocage ou o romântico Garrett: "Sospeitas, que me quereis?" e ele vai insistindo no desejo de esclarecê-las, de ter a verdade:

Mas queria esta certeza

daquela que me atormenta,

porque em tamanha estreiteza

ver que disso se contenta,

é descanso da tristeza.

Ao sofrimento de saber-se não-amado - que é o de sempre - acrescenta-se o de julgar-se preterido. Aquele lhe traz mágoa, dor, pena (palavras freqüentes na expressão da coita de amor), sempre acompanhadas de uma triste resignação ou até um doce contentamento de ser triste. Este lhe dá momentos de revolta, desejos de quebrar a passividade da aceitação e reagir:

Já nas iras me inflamei,

nas vinganças, nos furores

que, já doudo, imaginei;

e já mais doudo jurei

d'arrancar d'alma os amores.

Já determinei mudar-me

para outra parte com ira;

despois vim a concertar-me

que era bom certificar-me

no que mostrava a mintira. (Grifos nossos)

Como se vê, a violência da reação é passageira: caindo em si, reconsidera e vê que

[...] despois já de cansadas

as fúrias do imaginar,

vinha enfim a arrebentar

em lágrimas magoadas

e bem pera magoar. (Grifos nossos)

Da área semântica de ira, vingança, loucura, furor, fúria, passa à da mágoa e das lágrimas, estas não manando ou correndo, mas rebentando - último vestígio da violência anterior. Lançado o desabafo, quase gritado, volta o Poeta a policiar-se a expressão e retoma o jogo das oposições, agora um tanto zombeteiro:

Olhai bem se me trazeis,

senhora, posto no fim,

pois neste estado a que vim,

para que vos confesseis,

se dão os tratos a mim.

e adiante:

Justiça tão mal olhada,

olhai com que cor se doura,

que quer, no fim da jornada,

que vós sejais confessada,

para que eu seja o que moura!

Mas os últimos versos recuperam, pelo menos em parte, o tom momentaneamente perdido:

E assi vou desesperado,

porque estes são os costumes

d'amor, qu'é mal empregado,

do qual vou já condenado

ao inferno de ciúmes! (Grifos nossos)

Foi este verso final, sobretudo, que nos lembrou Bocage, o Bocage que descreve o ciúme como "veneno letífero", "carrancudo", "rábido", "letal" [46] , o Garrett de "Este inferno de amar" [47] , tão confessional, como se sabe.

A "Carta a ua dama" - o segundo mais extenso poema camoniano da medida velha -, em seus quarenta versos introdutórios, torna patente o ato da escritura: o Amor dita o que o Poeta deve escrever - "Altos efeitos de ti / e daquela a quem te dei". O Poeta quer que a senhora os ouça, mesmo estando tão afastada: "ouvi, que, pois Amor nota, / milagres se hão de notar" [48] (atente-se para o duplo sentido de notar = anotar e observar). Nessa introdução, faz Camões um jogo dos mais realizados com a polissemia da palavra pena:

Querendo escrever, um dia,

o mal que tanto estimei,

cudando no que poria,

vi Amor que me dezia:

- Escreve, que eu notarei. -

E, como para se ler,

não era história pequena

a que de mim quis fazer,

das asas tirou a pena

com que me fez escrever.

 

E, logo como a tirou,

me disse: - Aviva os espritos,

que, pois em teu favor sou,

esta pena que te dou

fará voar teus escritos. -

E, dando-me a padecer

tudo o que quis que pusesse,

pude, enfim, dele dizer

que me deu com que escrevesse

o que me deu a escrever. [49]

Sobre este passo são dignas de consideração as observações feitas por Hernâni Cidade [50] e, mais detidamente, por Antônio José Saraiva. Este acentua que o jogo verbal atinge maior profundeza

[...] em dizer que o Amor tirou das suas asas a pena com que fez escrever o Poeta. A pena do escritor? A pena do amante? Justamente, elas estão unidas [...] E que pena fará voar seus escritos? A dor que escreve ou o com que escreve a dor? Na coincidência dos dois significados é que está o pensamento do Autor. E os versos finais: "me deu com que escrevesse / o que me deu a escrever" têm um denso conteúdo. E de notar é como o pensamento parece estar consubstanciado nas palavras, confundir-se com elas, a ponto de as tentativas para o traduzir noutras parecerem atraiçoá-lo ou pelo menos enfraquecê-lo, o que resulta justamente de toda a construção se basear nas virtualidades semânticas daquela mesma palavra pena. [51]

Não há nada a acrescentar a esta análise de Saraiva; apenas lembraríamos que Camões retoma o jogo em outros poemas, como no mote: "Perguntais-me quem me mata?", cuja glosa começa:

E se a pena não m'atiça

A dizer pena tão forte [52]

ou em

Perdigão perdeo a pena,

Não há mal que lhe não venha.

 

Perdigão, que o pensamento

Sobio em alto lugar,

Perde a pena do voar,

Ganha a pena do tormento.

Não tem no ar nem no vento

Asas com que se sostenha:

Não há mal que lhe não venha.

 

Quis voar a ua alta torre,

Mas achou-se desasado;

E, vendo-se depenado,

De puro penado morre.

S'a queixumes se socorre,

Lança no fogo mais lenha:

Não há mal que lhe não venha. [53]

mas só atinge a máxima altura em "Sobre os rios":

[...] se amor assi o ordena,

rezão é que canse a pena

de escrever pena tamanha.

Porém se, pera assentar

o que sente o coração,

a pena já me cansar,

não canse para voar

a memória em Sião. [54]

Ainda voltamos à "Carta a ua dama", para assinalar a presença do que Curtius [55] insere no item "Metaforismo amaneirado": o uso da palavra hydrops e seu derivado hydropicus, nos séculos IV e V, no sentido de "presunção intelectual"; de novo no séc. XII, agora com o sentido de "sede mórbida" (os três exemplos que ele dá são de "sede de dinheiro") e no século XVII (Góngora, Calderón, Gracián). O exemplo de Góngora ainda se refere à ambição: Calderón é que aplica a metáfora ao desejo amoroso:

Con cada vez que te veo

Nueva admiración me dás,

Y cuando te miro más,

Aun más mirarte deseo:

Ojos hidrópicos creo

Que mis ojos deven ser... [56]

Pois Camões já dissera:

Do mal que Amor em mim cria

Quando aquela Fénix vejo,

São de todo ficaria;

Mas fica-me hidropesia,

Que, quanto mais, mais desejo. [57]

Como Camões (e antes dele), dois grandes poetas da medida velha tinham feito versos que pretendiam captar a insolúvel dicotomia da alma humana nas malhas de uma linguagem em que os pronomes pessoais e possessivos da primeira pessoa, cindidos entre "mim mesmo e mim", continham "mim" e "imigo de mim", "cuidado e cuidado". Nestes poemas, cuja atualidade acaba de ser testada pela musicalização de "Comigo me desavim", o que os destaca da maioria das obras da época é a reflexão sobre o problema existencial do homem em si, sem causa externa revelada, nem mesmo o amor, causa máxima de desconcerto na lírica de então.

Em Bernardim, o "Vilancete seu" condensa o melhor do pequeno poema:

Antre mim mesmo e mim

não sei que s'alevantou,

que tão meu imigo sou.

Mas a segunda volta o explicita e reforça:

De mim me sou feito alheo;

antr'o cuidado e cuidado

está um mal derramado,

que por mal grande me veo.

Nova dor, novo receo

foi este que me tomou:

assi me tem, assi estou. [58]

Constata ele o fato, sem esboço de reação; Sá de Miranda, mesmo sentindo a vanidade do desejo, gostaria de fugir. A impossibilidade de fugir-se e a necessidade de trazer-se criam a tensão que produz esta "Cantiga":

Comigo me desavim,

vejo-m'em grande perigo:

não posso viver comigo,

nem posso fogir de mim.

 

Antes qu'este mal tevesse

da outra gente fugia;

agora já fugiria

de mim, se de mim podesse.

Que cabo espero, ou que fim,

deste cuidado que sigo,

pois trago a mim comigo

tamanho imigo de mim? [59]

Desta obra da juventude de Sá de Miranda deve ter Camões utilizado as rimas perigo / comigo, além da própria palavra perigo, síntese da situação na cantiga mirandina, e que em Camões passa a ser ele mesmo: "eu mesmo sou meu perigo". E, complicando maneiristicamente o seu poema, ele analisa a sua possível reação, se pudesse livrar-se de si: não teria gosto. E por quê? Enquanto Bernardim e Sá de Miranda só falaram do mal que lhes veio, nosso Poeta joga com mal / bem, gosto / desgosto, sublinhando a cisão do pronome da 1a pessoa com a qualificação das suas metades e gerando ambigüidade:

MOTE

De que me serve fugir

de morte, dor e perigo,

se me eu levo comigo?

 

VOLTAS

Tenho-me persuadido,

por rezão conveniente,                  5

que não posso ser contente,

pois que pude ser nascido.

Anda sempre tão unido

o meu tormento comigo,

que eu mesmo sou meu perigo.                                     10          

 

E, se de mi me livrasse,

nenhum gosto me seria,

que, não sendo eu, não teria

mal que esse bem me tirasse.

Força é logo que assi passe:                             15

ou com desgosto comigo,

ou sem gosto e sem perigo. [60]                                    

Veja-se como nos parece que se deve entender esta última volta, a partir do mote. Em: "me eu levo comigo", podemos considerar que o pronome reto eu corresponde ao eu total, formado de me e comigo, que são levados juntos pelo eu. Na primeira glosa, o eu = perigo. Na segunda, eu seria igual a não eu ("não sendo eu") se quebrasse a sua totalidade ("se de mi me livrasse"), pois, privado da sua duplicidade, "não teria / mal que esse bem me tirasse". E aqui está a ambigüidade de que falamos: são possíveis duas leituras deste verso, conforme se considere qual dos dois substantivos (mal / bem) é o sujeito ou o objeto direto. Assim, o que importa não é que se deva eliminar o mal (ou o bem) para obter a solução do problema, mas que não é possível unificar o ser humano, homogeneizá-lo: há que conservar-lhe a contradição essencial, embora esta também não leve a nenhuma solução tranqüilizadora:

Força é logo que assi passe:

ou com desgosto comigo,

ou sem gosto e sem perigo.

Só no nível dos significantes, e no primeiro momento de leitura, parece haver oposição entre os dois últimos versos - "ou com desgosto comigo" / "ou sem gosto e sem perigo" -, causada pela contraposição das preposições antônimas com e sem. Logo em seguida, porém, o leitor dá-se conta de que há entre as primeiras metades dos dois versos  uma quase sinonímia: "com desgosto" equivale a "sem gosto", enquanto que, na segunda, "comigo" se opõe a "sem perigo" = sem mim (não esqueçamos que o Poeta dissera, no v. 10, "eu mesmo sou meu perigo.").  Estamos aqui diante de mais um passo do breve poema em que se acentua a opacidade do texto, para que dele ressalte a sua literalidade e, refletido nela, o próprio labirinto da psique humana: o que estes versos confirmam ao fim do poema é que: comigo ou sem mim ("sem perigo") não há gosto em viver (se Hauser conhecesse estes versos, não hesitaria em louvar-lhes os concetti).

Permitimo-nos, nestas apreciações, estender ao humano em geral o que pareceria restringir-se à experiência do Poeta; se o fizemos foi por termos encontrado dois versos que a isso nos autorizaram: "não posso ser contente / pois que pude ser nascido" (vv. 6-7). A origem de tudo está em ter nascido. E isso ocorre a toda a gente.

O confronto dos três poemas não foi uma fuga ao nosso roteiro: antes, o desejo de acentuar, em circunstâncias idênticas, o procedimento de três poetas de alto nível. E não pretendemos em nenhum momento um juízo de valor, mas nos preocupamos em distinguir Camões dos dois que o antecederam, sobretudo pelo tratamento maneirista dado ao tema comum.

Capaz de adequar ao significado o significante pertinente, em assuntos de tanta valia, também o faz Camões na poesia dita de circunstância, cujo exemplo encontrou no Cancioneiro Geral.

São graciosíssimas as trovas do "Convite que Luís de Camões fez na Índia a certos fidalgos cujos nomes aqui vão" [61] , as que enviou "a ua dama que lhe mandou pedir alguas obras suas" [62] , "a ua senhora que estava rezando por uas contas" [63] , e muitas mais. Em outras se acrescenta uma certa dose de malícia, nunca grosseira, em que se permite um à vontade que não se permitirá na lírica da medida nova, mas que retoma em certos passos d'Os Lusíadas. Vejamos alguns exemplos: "Mote a ua dama que lhe chamou diabo por nome Foã dos Anjos" ele responde:

MOTE

Senhora, pois me chamais

tão sem rezão tão mau nome,

inda o diabo vos tome.

 

VOLTAS

Quem quer que vio o que leo

terá por novo e moderno

ter, quem vive no Inferno,

o pensamento no Ceo.

Mas se a vós pareceo

que me estava bem tal nome,

esse diabo vos tome.

As duas outras voltas terminam com variantes desta, nas quais reforça a pretensão de tomá-la; a quarta revela-lhe a decisão de aceitar o nome:

mas, pois que me dais tal nome,

tomo-o, para que vos tome. [64]

Mandando a outra um papel de alfinetes, joga com os alfinetes e com o verbo picar: ela o pica com os raios de seus olhos, tão agudos, que, em vez de "dar picadelas", "dão feridas". Mas ele espera dos seus alfinetes "que vão lá", "que vos apertem" e inveja-os porque "chegam / onde eu não posso chegar" [65] . A mais ousada pilhéria que encontramos na sua lírica está num "Outro [mote] a outra dama que estava também doente":

MOTE

Deu, senhora, por sentença

Amor, que fôsseis doente,

para fazerdes à gente

doce e fermosa a doença.

 

Não sabendo Amor curar,

foi a doença fazer

fermosa, para se ver,

doce, para se passar.

Então, vendo a diferença

que há de vós a toda a gente,

mandou que fôsseis doente

para glória da doença.

 

E digo-vos de verdade

que a saúde anda envejosa,

por ver estar tão fermosa

em vós essa infirmidade;

não façais, logo, detença,

senhora, em estar doente,

porque adoecerá a gente

com desejos da doença.

 

Que eu, por ter, fermosa dama,

a doença que em vós vejo,

vos confesso que desejo

de cair convosco em cama.

Se consentis que me vença

este mal, não houve gente

da saúde tão contente,

como eu serei da doença. [66]

Citemos agora alguns poemas que seguem as técnicas do Cancioneiro Geral, enumeradas na obra de Pierre Fabri (v. nota 12): o "Labarinto do autor queixando-se do mundo" [67] , composto de cinco coplas de 10 pés, que é possível ler de várias maneiras, o "ABC feito em motes" [68] e sobretudo as "Endechas" [69] que são realmente, no gênero, uma excelente realização:

Vós sois ua dama          Do grão merecer

Das feias do mundo;     Sois bem apartada;

De toda a má fama       Andais alongada

Sois cabo profundo,       Do bem-parecer.

 

A vossa figura               Bem claro mostrais

Não é pera ver;             Em vós fealdade:

Em vosso poder            Não há i maldade

Não há fermosura.        Que não precedais.

 

Vós fostes dotada         De fresco carão

De toda a maldade;       Vos vejo ausente;

Perfeita beldade             Em vós é presente

De vós é tirada.             A má condição.

 

Sois muito acabada       De ter perfeição

De tacha e de glosa:      Mui alheia estais;

Pois, quanto a fermosa  Mui muito alcançais

Em vós não há nada.     De pouca razão.

O poema, a nosso ver, deveria vir escrito sem a bipartição de cada pé de arte-maior, para que surgisse primeiro o louvor à dama e só depois se descobrisse a maldade do deslouvor. Além destas duas leituras, podemos fazer outras:

·         lendo os pés de arte-maior do último para o primeiro:

Em vós não há nada de pouca razão,

Pois, quanto a fermosa, mui muito alcançais;

De tacha e de glosa mui alheia estais... etc.

·         lendo os pés quebrados do último para o primeiro:

De pouca razão

Mui muito alcançais;

Mui alheia estais

De ter perfeição... etc.

·         lendo a coluna da direita antes da da esquerda:

De grão merecer vós sois uma dama;

Sois bem apartada das feias do mundo;

Andais alongada de toda a má fama... etc.

É uma evidente exibição de virtuosismo, mas o que valoriza o poema é, a nosso ver, esse jogo de parecer e ser, em que o primeiro aparece no pé inteiro, de grave solenidade, e o segundo só se descobre ao quebrar-se a aparência e surgir o pé quebrado, breve e, para mais, com um acento secundário constante na segunda sílaba (com exceção do antepenúltimo da coluna da direita), que mais o torna zombeteiro.

Valoriza Saraiva o estilo coloquial palaciano, que se aproxima da língua falada e na literatura só foi cultivado em peças teatrais, como as de Jorge Ferreira de Vasconcelos e Camões, mal aflorando na lírica [70] . Um exemplo deste aflorar, temo-lo no mote: "Caterina bem promete; / eramá! como ela mente!" [71] , onde a interjeição popular, tão usada por Gil Vicente, dá a nota coloquial. Este tom justifica o desabrimento com que diz: "Jurou-me aquela cadela / de vir, pela alma que tinha" de que é este o único exemplo em Camões. Mas o melhor repositório de linguagem popular está nos "Disparates seus na Índia" [72] , onde, além de expressões feitas, como "no seu seio / cudam que trazem Paris" (que corresponde a "julgam que trazem o rei na barriga"), aparece mais de uma dezena de provérbios, alguns dos quais permanecem até hoje, como: "honra e proveito não cabem num saco", "quem torto nace, tarde se endireita", etc. E é natural que tal linguagem se encontre numa sátira, em que se apontam disparates, como eram as obras vicentinas, ou as do Chiado, por exemplo, e em que, parecendo brincar, se faz uma crítica bastante séria, como podemos ver nas últimas coplas do poema:

Ó vós, que sois secretários

Das conciências reais,

Qu'entre os homens estais

Por senhores ordinários:

Por que não pondes um freo

Ao roubar, que vai sem meio,

Debaixo de bom governo?

Pois um pedaço de inferno

Por pouco dinheiro alheo

Se vende a mouro

E a judeo?

 

Porque a mente, afeiçoada

Sempre à real dignidade,

Vos faz julgar por bondade

A malícia desculpada?

Move a presença real

Ua afeição natural

Que logo inclina ao juiz

A seu favor e não diz

Um rifão muito geral

Que o abade, donde canta,

Daí janta?

 

E vós bailhais a esse som?

Por isso, gentis pastores,

Vos chama a vós mercadores

Um que só foi pastor bom.

Com muitas lacunas - conscientes e motivadas por não ser possível estender-nos mais, dada a destinação deste trabalho -, vamos dando por encerrada a nossa visão da dimensão tradicional na lírica camoniana.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

[1] Esta [Arte de trovar], cujo título, ajuntado posteriormente, não consta do original cuja primeira parte se perdeu (começa no capítulo IV), precede as cantigas do chamado primitivamente Cancioneiro Colocci-Brancutti, passando a Cancioneiro da Biblioteca Nacional quando da sua aquisição por esta Biblioteca, em 1924.

[1] ENZINA, Juan del. "Arte de poesía castellana". In: MENÉNDEZ PELAYO, Marcelino.  Antología de poetas líricos castellanos, 10 vol. Santander: Aldus, 1944-5, vol. IV, p. 38-9. Mantivemos a ortografia original.

[1] GUERREIRO, Miguel do Couto. Tratado da versificação portugueza. Lisboa: Of. Patr. de Francisco Luiz Ameno, 1784. "Contando até o acento dominante, / (Que basta para o Verso ser constante)": Regra IX, p. 6.

[1] Jorge Manrique, o célebre autor das Coplas por la muerte de su padre don Rodrigo.

[1] ENZINA, op. cit., p. 40. Em Gil Vicente encontramos os pés quebrados em combinação com os inteiros, num mesmo processo de valorização de certos elementos e quebra da monotonia rítmica. No Auto da Feira, na fala do Serafim (v. 218-26), temos um belo exemplo disso: "À feira, à feira, igrejas, mosteiros, / pastores das almas, papas adormidos; / comprai aqui panos, mudai os vestidos, / buscai as samarras dos outros primeiros, / os antecessores. / Feirai o carão que trazeis dourado; / ó presidentes do Crucificado, / lembrai-vos da vida dos santos pastores / do tempo passado!" Grifamos os dois pés quebrados para mais realçar a sua coincidência no aspecto basicamente enfocado: a oposição entre o passado exemplar e o presente condenável. Citamos apud BERARDINELLI, Cleonice. Antologia do teatro de Gil Vicente. Rio de Janeiro: Grifo, em convênio com o INL, 1971, p. 50.

[1] Cf. Introdução a PROENÇA, Cavalcanti. Literatura popular em verso. Antologia, tomo I, Rio de Janeiro: MEC, Casa de Rui Barbosa, 1964,

[1] SARAIVA, António José. Luís de Camões. Lisboa: Europa-América, 1959, pp. 28-38.

[1] CIDADE, Hernâni. Luís de Camões: o lírico, 2. ed. rev. e ampliada. Lisboa: Bertrand, 1952,  p. 102.

[1] GRANGES, Ch.-M. des. Histoire de la Littérature Française, 41. éd. Paris: Hatier, 1946, p. 184-5.

[1] ENZINA, op. cit., p. 42.

[1] DF2, fo. 37.

[1] Rh, fo. 162 v.

[1] GRACIÁN, Baltazar. Tractado de agudeza y ingenio.(???)

[1] HAUSER, Arnold. Literatura y manierismo. Madrid: Guadarrama, 1969, p. 40.

CAMÕES, Luis de. Rimas. Reprodução fac-similada da edição de 1598. Estudo introdutório de Vítor Manuel de Aguiar e Silva. Braga: Universidade do Minho, 1980

[1] DF2, fo. 29 v: "Na fonte está Leanor".

GUILHADE, D. Joan Garcia de. Edição crítica, com Notas e Introdução de Oskar Nobiling. Erlangen: 1907, p. 24

BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du. Opera omnia. Direção de Hernâni Cidade, 6 vol. Lisboa: Bertrand, 1970, vol. I, p. 22 e 25.

[1] GARRETT, Almeida. Folhas caídas. Lisboa: Portugália, 1955, p. 41.

CURTIUS, Ernst Robert. Literatura européia e idade média latina. Rio de Janeiro: INL, 1957, p. 290-1.

RIBEIRO, Bernardim. "Vilancete seu". In : RESENDE, Garcia de. Cancioneiro Geral, nova edição preparada pelo Dr. A. J. Gonçálvez Guimarães. Coimbra : Imprensa da Universidade, 1913, vol. V, p.271 (modernizamos a grafia).

[1] SÁ, Doutor Francisco de. "Cantiga". In : RESENDE, op. cit., vol. III, p.152 (No C. Geral, Sá de Miranda é chamado como citamos).

[1] CAMÕES, Luís de. Obras completas, com prefácio e notas do Prof. Hernâni Cidade, vol. I, 2. ed. Lisboa: Sá da Costa, 1954, pp.  166-75.

[1] Ib., p. 163. Na edição preparada por António Salgado Júnior (Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1963) este poema tem o seguinte título: "Estanças na medida antiga que têm duas contrariedades, louvando e deslouvando ua Dama".

 



[1] Esta [Arte de trovar], cujo título, ajuntado posteriormente, não consta do original cuja primeira parte se perdeu (começa no capítulo IV), precede as cantigas do chamado primitivamente Cancioneiro Colocci-Brancutti, passando a Cancioneiro da Biblioteca Nacional quando da sua aquisição por esta Biblioteca, em 1924.   

[2] ENZINA, Juan del. "Arte de poesía castellana". In: MENÉNDEZ PELAYO, Marcelino.  Antología de poetas líricos castellanos, 10 vol. Santander: Aldus, 1944-5, vol. IV, p. 38-9. Mantivemos a ortografia original.

[3] GUERREIRO, Miguel do Couto. Tratado da versificação portugueza. Lisboa: Of. Patr. de Francisco Luiz Ameno, 1784. "Contando até o acento dominante, / (Que basta para o Verso ser constante)": Regra IX, p. 6.

[4] Jorge Manrique, o célebre autor das Coplas por la muerte de su padre don Rodrigo.

[5] ENZINA, op. cit., p. 40. Em Gil Vicente encontramos os pés quebrados em combinação com os inteiros, num mesmo processo de valorização de certos elementos e quebra da monotonia rítmica. No Auto da Feira, na fala do Serafim (v. 218-26), temos um belo exemplo disso: "À feira, à feira, igrejas, mosteiros, / pastores das almas, papas adormidos; / comprai aqui panos, mudai os vestidos, / buscai as samarras dos outros primeiros, / os antecessores. / Feirai o carão que trazeis dourado; / ó presidentes do Crucificado, / lembrai-vos da vida dos santos pastores / do tempo passado!" Grifamos os dois pés quebrados para mais realçar a sua coincidência no aspecto basicamente enfocado: a oposição entre o passado exemplar e o presente condenável. Citamos apud BERARDINELLI, Cleonice. Antologia do teatro de Gil Vicente. Rio de Janeiro: Grifo, em convênio com o INL, 1971, p. 50.

[6] Cf. Introdução a PROENÇA, Cavalcanti. Literatura popular em verso. Antologia, tomo I, Rio de Janeiro: MEC, Casa de Rui Barbosa, 1964, p. 5.

[7] ENZINA, op. cit., p. 42.

[8] DF2, fo. 37.

[9] Rh, fo. 162 v.

[10] SARAIVA, António José. Luís de Camões. Lisboa: Europa-América, 1959, pp. 28-38.

[11] CIDADE, Hernâni. Luís de Camões: o lírico, 2. ed. rev. e ampliada. Lisboa: Bertrand, 1952,  p. 102.

[12] GRANGES, Ch.-M. des. Histoire de la Littérature Française, 41. éd. Paris: Hatier, 1946, p. 184-5.

[13] CIDADE, op. cit., p. 102-3.

[14] Ib., p. 106.

[15] SARAIVA, op cit, p. 29.

[16] GRACIÁN, Baltazar. Arte de ingenio, tratado de la agudeza. En que se explican todos los modos, y diferencias de Conceptos. Por Lorenço Gracian. En Madrid, por Juan Sanchez, Ano 1642.

[17] HAUSER, Arnold. Literatura y manierismo. Madrid: Guadarrama, 1969, p. 40.

[18] Ib., p. 50.

[19] Ib., p. 54-64.

[20] Ib. 64.

[21] Ib., p.75.

[22] Ib., p. 76-7.

[23] Estas redondilhas só aparecem na edição de 1668, de Álvares da Cunha (AC); cf. n. 62.

[24] Sempre que constem da edição das Rhythmas (Rh), preferimos citar por ela. Aqui: Rh, fo. 157 v.

[25] Seguimos aqui a ed. CAMÕES, Luis de. Rimas. Reprodução fac-similada da edição de 1598. Estudo introdutório de Vítor Manuel de Aguiar e Silva. Braga: Universidade do Minho, 1980, p. 166 v. Na edição de 1595 (Rh) faltam as dez últimas coplas.

[26] Rh, fo. 169.

[27] DF2, fo. 29 v: "Na fonte está Leanor".

[28] Rh, fo. 163 v.

[29] Rh, 162.

[30] Rh, 161.

[31] Rh, fo. 166 v.

[32] Rh, fo. 159 v.

[33] Estas redondilhas aparecem em 1616, na ed. de Domingos Fernandez. Aqui: DF2, fo. 31 v.            

[34] Rh, 163.

[35] GUILHADE, D. Joan Garcia de. Edição crítica, com Notas e Introdução de Oskar Nobiling. Erlangen: 1907, p. 24.

[36] Rh, fo. 160-160 v.

[37] Rh, fo. 162 v.

[38] DF2, fo. 37-8 v.

[39] Este verso hipométrico foi corrigido por Hernâni Cidade para: "A alma, sem o vós saberdes", que o completa bem semanticamente.

[40] Em DF2 está: "c'os olhos verdes", o que torna o verso hipermétrico. Na verdade, parece-nos preferível que o substantivo olhos venha indeterminado e propomos a correção acima.

[41] Em DF2 está: "Que vos faz", o que torna o verso hipermétrico. Hernâni Cidade e Costa Pimpão o alteram para "Vos faz"; preferimos "Que faz".

[42] Rh, fo. 163.

[43] Rh, fo. 162 v-3.

[44] Rh, fo. 139-41 v.

[45] Rh, fo. 142 v-3 v.

[46] BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du. Opera omnia. Direção de Hernâni Cidade, 6 vol. Lisboa: Bertrand, 1970, vol. I, p. 22 e 25.

[47] GARRETT, Almeida. Folhas caídas. Lisboa: Portugália, 1955, p. 41.

[48] Em Rh, imediatamente após estes versos há a indicação: "Nota", seguida dos versos em que se vão enumerando, em comparações sucessivas com lendas ou experiências passadas, os efeitos do amor no Poeta.

[49] Rh, fo. 139-41 v.

[50] CIDADE, op. cit., p. 104.

[51] SARAIVA, op. cit., p.32-3.

[52] Ri, fo. 183.

[53] Ri, fo. 184 v.

[54] Rh, fo. 137.

[55] CURTIUS, Ernst Robert. Literatura européia e idade média latina. Rio de Janeiro: INL, 1957, p. 290-1.

[56] Ib., p. 291.

[57] Cf. "Carta a ua dama", acima citada: Rh, fo. 140.

[58] RIBEIRO, Bernardim. "Vilancete seu". In : RESENDE, Garcia de. Cancioneiro Geral, nova edição preparada pelo Dr. A. J. Gonçálvez Guimarães. Coimbra : Imprensa da Universidade, 1913, vol. V, p.271 (modernizamos a grafia).

[59] SÁ, Doutor Francisco de. "Cantiga". In : RESENDE, op. cit., vol. III, p.152 (No C. Geral, Sá de Miranda é chamado como citamos).

[60] Rh, fo. 167-167 v.

[61] Rh, fo. 145-146.

[62] Rh, fo. 153.

[63] Rh, fo. 144 v.

[64] Rh, fo. 155 v.

[65] Rh, fo. 165.

[66] Rh, fo. 154.

[67] Rh, fo. 156 v-157.

[68] CAMÕES, Luís de. Obras completas, com prefácio e notas do Prof. Hernâni Cidade, vol. I, 2. ed. Lisboa: Sá da Costa, 1954, pp.  166-75.

[69] Ib., p. 163. Na edição preparada por António Salgado Júnior (Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1963) este poema tem o seguinte título: "Estanças na medida antiga que têm duas contrariedades, louvando e deslouvando ua Dama".

[70] SARAIVA, op. cit., p.26-7.

[71] Rh, fo. 156-156 v.

[72] Ri, 166 v-168v. Em Rh, 167 v-168 v, faltam 9 coplas, mais 4 pés.