Sumário

O mar e a terra que foram: uma leitura de Memória de elefante de António Lobo Antunes

Vincenzo Arsillo
Universidade Ca' Foscari de Veneza
A Manuel G. Simões

A verdade é sempre concreta
Ludwig Wittgenstein

A visão de um espelho começa sempre de fora: assim, por um olhar que de fora tente penetrar no interior de si mesmo, e de si mesmo como passado, o romance que abre a produção de António Lobo Antunes, Memória de elefante (1979), constitui-se e constrói a partir de um indício seminal de indubitável valor. O limiar do exerga , de facto, revela e esconde, antecipa e adia: "[...] as large as life and twice as natural ", de Lewis Carrol, Through the looking-glass . A dimensão de sobredimensionamento e de vastidão, e dupla do natural, isto é, como uma espécie de ampliacão progressiva da visão, que não acontece através de uma distorção lógica ou determinística, mas através daquele acto mágico e inconsciente, num mesmo tempo, do atravessamento do espelho como atravessamento de nós mesmos , do passar para a outra parte da realidade através do objecto que nos dá a ilusão da imagem de nós mesmos, ou seja o espelho, como limiar e não como lugar de re-velação. O espelho é um des-vendar que cumpre uma re-velação (e, note-se, que "revelar" pode ter também, e não casualmente, o sentido de "velar duas vezes") 1 . A narração abre­se, portanto, sob a dupla ambivalência entre símbolo e metáfora, entre limiar e limite : poderíamos dizer, antecipando veladamente as conclusões, que entre o sentimento da existência como limiar e aquele da vida como limite em que cai a narração antunesiana, a narração oximoricamente e obsessivamente unitária do dia "ordinário", da união entre um dia e uma noite, que o escritor-narrador descreve no fluxo afabulatório do romance (ao qual não será impróprio atribuir uma cifra joyciana, cujo carácter tentaremos definir mais adiante).

A narração, portanto, desenvolve-se num plano aparentemente e linearmente mimético (a narração de um dia), mas o quadro narrativo caracteriza-se imediatamente por um duplo nível de representação, cuja força está justamente no contínuo e dialético interpor-se e forçar-se: aquele da existência como sucessão linear de eventos e aquele da vida como sentimento da existência. Por isso a representação constrói-se, desde os primeiros passos do romance, por uma espécie de contínuo universo de ressonâncias verbais, que não formam propriamente uma cadeia afabulatória, mas sim uma escrita per-fabulatória: ou seja, é como se a palavra, a escrita como infinito acto material de constituição da palavra e do discurso não tentasse cumprir um acto de redundância no que respeita o que está fora do sujeito narrativo ou do autor, mas, parece, em Lobo Antunes, que a palavra sirva e venha utilizada como instrumento (mesmo no sentido etimológico de " instrumentum ") para atravessar , para olhar-através , no sentido wittgensteiniano, o imenso e misterioso mecanismo que, por convenção, chamamos "realidade" e a história pessoal como inevitável e sempre repetida, isto é, obssessionante exemplum , sempre dramático e existencialmente falimentar 2 . Deste, talvez, derive dimensão de revolta contra a ordem estabelecida com que se abre o texto, a dimensão metamórfica dos sujeitos que formam o pessoal da "gestão" manicomial, como, por exemplo, o porteiro, ainda mais antifrasticamente representado como um "Júpiter": "de tempos a tempos, metamorfoseado em cobrador, aquele Júpiter de sucessivas faces surgia-lhe à esquina da enfermaria de pasta de plástico no sovaco a estender um papelucho imperativo e suplicante: - A quotazinha da Sociedade, senhor doutor" 3 .

Do mesmo modo, a dimensão de representação artística, ou ainda melhor, do contínuo reenvio figurativo-criativo a obras e pintores contra a ordinariedade "imagética" da vida como puro sistema organizado , isto é, castrante e alienador, constitui uma das formas expressivas do protagonista-narrador (e, note-se, que a contínua passagem, durante o romance inteiro, da terceira para a primeira pessoa, o diálogo narrativo incessante entre olhar interior e olhar estranhado , no jogo narrativo, é um outro sinal determinante desse sentido de ambivalência, da oximórica ambivalência do sentimento do existir), o qual dá forma, mesmo no acto da escrita, ao elemento irrenegável da revolta contra o mundo, contra o seu "ser bem" e a sua hipocrisia, escrita entendida eticamente e esteticamente como uma voz que interiormente fala a si mesmo e que através da voz dos loucos toma corpo, faz-se corpo 4 .

E o corpo é, sobretudo aquele da perda, o outro de si , aquele da separação e do desejo: o corpo feminino. O corpo feminino, o universo feminil são um espelho, mais uma vez, em que se reflecte, do qual se apercebe a estranheza, o narrador, e que se modula na imagem materna, "[...] classe dos mansos perdidos [...] com o curro do útero da mãe, único espaço possível onde ancorar as taquicárdias da angústia" 5 , em que a figura materna, "movida por um tropismo vegetal de girassol" 6 , vem dramaticamente representada quase como numa gag de sabor beckettiano, expressiva da incomunicabilidade e inutilidade da troca entre sujeitos, até mesmo entre mãe e filho (a mãe representa já uma possível imagem inversa do elefante, do que é ancestral e interioríssimo, pois anterior a todas as histórias, pertencente à vida nua, ou seja à vida como essa é e nos vem dada no momento do nascimento, e que tentamos sempre recompor, de re-cordar no acto memorial?). Do mesmo modo, as velhas internadas do hospital, a sua descrição de imobilidade e de excesso de sentido ao mesmo tempo, representam aquele tentativo vão de decifrar entre a linha, "espirais", das rugas, a leitura impossível da dor do passado, a sua reconstrução, mas revelam só a possibilidade de ver fisicamente os sinais, exteriormente, como uma imagem que tenha extrometido de si o próprio passado através da dor ou, que é o mesmo, como num espelho, uma imagem que possa representar ela mesma só através da dor, pois é a única coisa que lhe ficou:

[...] o médico tentava em vão decifrar nas espirais das suas rugas, que lhe lembravam as misteriosas redes de fendas dos quadros de Vermeer, juventude de bigodes encerados, coretos e procissões [...] As octogenárias pousavam nele os olhos descoloridos de vidro, ocos como aquários sem peixes, onde o limo ténue de uma ideia se condensava a custo na água turva de recordações brumosas. 7

 

As rugas das velhas internadas como aquelas do elefante? O vidro opaco dos recordos, das recordações brumosas, o vazio daquele olhar contrapõe-se à terrível, pudicamente mortal claridade do espelho (recorde-se também, por exemplo, a simbologia e analogia entre espelho e água no mito de Narciso). Paralelo a esse movimento, está o contínuo, expressivo deslocamento semântico do plano objectual para aquele artístico-literário, a mulher louca que vagueia "como o espectro de Charlotte Brontë" 8 a que corresponde, na construção do texto, como um espaço físico e mental num mesmo tempo, feito de correspondências que revelam-se sempre como ausências, a consciência de uma espécie de doença universal, da qual ninguém é excluído: "(quem entre aqui para dar pastilhas, tomar pastilhas ou visitar nazarenamente as vitimas das pastilhas é doente, sentenciou o psiquiatra no interior de si mesmo)" 9 .

O corpo, portanto, como o espelho, é o próprio limite e o próprio limiar 10 , e no acto sexual revela-se, ainda mais dramatica­mente, a condição de alienação à qual a loucura, loucura como internamento, conduz: assim, o sexo torna-se a presença de um contínuo desafio verbal com o corpo do outro, como um desvendar sem revelação. E assim, no acto de auto-erotismo - o preto que se masturba - torna-se a hipóstase da dramática, indizível pena da coincidência entre desejo e repressão, como acto de expressão­solidão, e essa visão-descrição assume uma dimensão de espetáculo trágico e silenciosamente alienado. Tanto que tem-se uma presença esolinguística, a língua faz-se outro , descendo num sarcástico comentário: " L'arroseur arrosé " 11 . O passar contínuo, de facto, de uma linguagem interior ou interiorizada à realidade exterior concretiza-se na escrita antunesiana como uma espécie de distorção verbal do objecto-realidade, que pela conotação linguística assume, conquista uma caracterização icástica, sempre no limite de uma absurda, quanto inevitável, classificação que não explica, isto é, que não revela, mas que denota puramente: "a esferográfica guardava a ordem estúpida de um diagnóstico definitivo" 12 . Os pacientes, ou seja, aqueles que vivem a dor no seu ser dor, assumem sempre uma figuração mitológico-simbólica que é naturalmente desmistificatória. A loucura, os "loucos" são, sobretudo, discursos, actos linguísticos, lógoi , dimensões verbais e dissonantes 13 . E a correspondência, ao mesmo tempo inevitável e impossível, entre corpo e palavra cria uma ulterior tensão lógica e narrativa, ou, melhor, lógica pois narrativa.

A dimensão mecânico-fisiológica do corpo, o olhar de um entomólogo-fisiólogo que tenta dar um sentido ao absurdo, por meio da descomposição-recomposição da máquina-corpo. A lógica da sobrevivência não é necessariamente aquela da oposição à morte, do contrastar a morte pela vida, mas aquela da vida como espaço de atravessamento da morte : daqui a consequência lógica, que a vida dá-se por negação, como soma de assurdez e não como cadeia de positividade. A relação entre corpo e transformação, entre acção e devir no fazer-se monstro, " monstrum ", ou seja objecto digno de maravilha. E se, modernamente, fosse mesmo esta maravilha-terror a ter-se perdido, a capacidade de encantamento definitivamente dissolvida, e da qual fica só a sombra vazia e surda de uma angústia prévia e póstuma? A impossíbilidade de ser gerado e a impossíbilidade de gerar.

À dramaticidade manifestada pela condição manicomial, e da existência como prisão da loucura, contrapõe-se dialeticamente, a acrescentar o sentido trágico, a dimensão fabulistica, entre Zorro e Pinóquio, do protagonista que resolve-se sempre numa espécie de descida aos ínfimos da própria vida-imaginação:

 

Quando é que me fodi?, perguntou-se o psiquiatra enquanto a Charlotte Brontë prosseguia impassível o seu discurso de Lewis Carrol grandioso. Como quem enfia sem pensar a mão no bolso à procura da gorgeta de uma resposta mergulhou o braço na gaveta da infância, brique-a-braque inesgotável de surpresas, tema sobre o qual a sua existência posterior decalcava variações de uma monotonia baça, e trouxe ao acaso, nítido na concha da palma, ele miúdo acocorado no bacio diante do espelho do guarda-fato em que as mangas dos casacos pendurados de perfil como as pinturas egípcias proliferavam a abundância de lianas moles dos príncipes de gales de seu pai. 14

 

A questão da origem é fundamental em Memória de elefante ; poderíamos, talvez, afirmar, que constitui o substrato e a condição imanente-a essa, note-se, liga-se, naturalmente, a questão, quaestio , isto é, procura-pergunta, do pai: o filho, espelho do pai? Embora a narração revele mesmo a inutilidade, a esterilidade, a in-diferença da memória do homem visto como estrutura social, em contraposição à utilidade/sentido da memória do sujeito como indivíduo. A pergunta fundamental, obsessiva, gira à volta do momento, como se fosse possível definir um momento, o momento em que tudo começa a perder-se e a desmoronar: "Mas ele, ele, ELE quando é que se lixara?" 15 (e note-se, que a pergunta, a repetição como forma de dramatização da interrogação será um dos estilemas recorrentes de todo o romance). "Nunca mais tem fim essa descida?" 16 , pergunta uma paciente, uma velha paciente, ao doutor, quase uma pergunta de Eurídice a um Orfeu que se afasta para sempre e desde sempre, um Orfeu tendido à "deslabirintação" 17 da máquina-mundo, por­que, montalianamente, existe sempre "um anel que não rege", e porque, misteriosamente, "existem boomerangs que não regressam ao ponto de partida?" 18 . O retorno , o "voltar", o acto de voltar, é, provavelmente, um outro dos centros focais e prospécticos da narração antunesiana:

Voltar como voltara anos atrás da guerra de África, às seis da manhã, para um mês de felicidade furtiva numa mansarda oblíqua, a certificar-se rua a rua, no táxi, de que nada mudara na sua ausência, país a preto e branco de muros caiados e de viúvas de negro, de estátuas de regicidas a levantarem braços carbonários em praças habitadas, em doses equitativas, de reformados e de pombos, uns e outros esquecidos já da alegria de um voo? A sensação de haver perdido a chave embora a conservasse no porta-luvas do automóvel entre papéis manchados de óleo e tubos de comprimidos para dormir fê-lo experimentar a angústia sem amarras da solidão absoluta: algo que desconhecia e lhe entortava os gestos impedia-o de marcar o número que se seguia ao seu nome na lista telefónica e pedir socorro à mulher que amava e o amava. A crueldade dessa impotência subiu-lhe aos olhos num nevoeiro de ácido difícil de reprimir como a turbulência de um arroto. Os dedos da enfermeira vieram tocar­lhe de leve o cotovelo:

- Se calhar, disse ela, sempre é capaz de haver boomerangs que não regressam. E conseguem manter-se à tona mesmo assim. E pareceu ao psiquiatra que acabava de receber uma espécie de estrema-unção definitiva 19 .

 

A visão de si, a especularidade do sujeito, revela-se no modo mais directo, dramaticamente directo, isto é, naquele das imagens, com a imagem fotográfica como signo distintivo e de continuidade de si, e tudo sempre entrelaçado a um sentido de dispersão musical do tempo, com "a voz de John Cage a repetir Every something is an echo of nothing " 20 , que, no olhar sarcástico e por meio da deformação de tipo expressionista do autor, definem-no como "um anarquista, um marginal" 21 .

A África, a marginalidade, o estar fora do centro das conven­ções, mas ao centro das coisas efectuais :

Que sabe este tipo de África, interrogou-se o psiquiatra à medida que o outro, padeira de Aljubarrota do patriotismo à Legião, se afastava em gritinhos indignados prometendo reservar-lhe um candeeiro da avenida, que sabe este caramelo de cinquenta anos da guerra de África onde não morreu nem viu morrer, que sabe este cretino dos administradores do posto que enterravam cubos de gelo no ânus dos negros que lhes desagradavam, que sabe este parvo da angústia de ter de escolher entre o exílio despaisado e a absurda estupidez dos tiros sem razão, que sabe este animal das bombas de napalm, das raparigas grávidas espancadas pela Pide, das minas a florirem sob as rodas da camionetas em cogumelos de fogo, da saudade, do medo, da raiva, da solidão, do desespero? Como sempre que se recordava de Angola um roldão de lembranças em desordem subiu-lhe das trias à cabeça na veemência das lágrimas contidas: o nascimento da filha mais velha silabado pelo rádio para o destacamento onde se achava, primeira maçãzinha de oiro de seu esperma, longas vigílias na enfermaria improvisada debruçado para a agonia dos feridos, sair exausto a porta deixando o furriel acabar de coser os tecidos e encontrar cá fora uma repentina amplidão de estrelas desconhecidas, com a sua voz a repetir-lhe dentro - Este não é o meu país, este não é o meu país, este não é o meu país. 22

 

O sentimento da lembrança de África 23 , de Angola como lugar, teatro , de guerra 24 liga-se ao sentimento de estranheza e deslocação ("- Este não é o meu país, este não é o meu país, este não é o meu país -", a África feita de "nomes mágicos" 25 , até alcançar a mesma autoconsciência da própria inconsciência, ou saber ou mistério: "[...] que sei eu de África?... saudade violentamente física como uma víscera que explode". A sufocante e inelutável des-localização do continente africano, e da experiência a ele ligado, do lugar como experiência que se tem dele, liga-se àquela do manicómio, instituindo uma espécie de paralelismo lógico-alterante, que, no ribaltar constantemente o lugar comum da visão, a in-diferença , repetimos, da visão, põe a nu com olhar incessante a sua dolorosa força expressiva. No aqui, no hic et nunc do manicómio -como especularmente naquele do outro lugar , a África -, o tempo se amplia, por compostos farmacêuticos administrados ou por natural-inatural dilatação da função cronoló­gica pela pirotecnia e a invenção-dilatação (que é sempre também uma dilação, um reenviar, um adiar o momento da morte) da linguagem, através da linguagem 26 . A linguagem tem um respiro que é um afã : o contínuo e terrível jogo verbal entre o aqui e o lá, entre o agora e o então, que misteriosamente e dramaticamente coincidem e reflectem-se no recíproco negar-se e afirmar-se. O drama está na especularidade singular ou da solidão (e, note-se, que "especular" deriva de " speculum " e " specula " do verbo " specio ", que tem também o sentido de "canto, ponto de observação" e de "reflexão"). E, então, a normalidade "provavelmente consiste apenas no empalhar em vida" 27 , a vida nua da loucura, como nua é a razão na sua essência, na sua origem; e à qual contrapõe-se "a pavorosa máquina doente da Saúde Mental" 28 , "a psiquiatria institucional, inventora da grande linha branca de separar a 'normalidade' da 'loucura' através de uma complexa e postiça rede de sintomas" 29 . A dimensão manicomial é dada, sobretudo, pelo sentimento da ausência e da tangível evidência que qualquer forma discursiva, enquanto forma cognitiva, seja sempre absurda, que, isto é, qualquer que seja a possível "ordem do discurso", esse desvele e revele somente a desordem de qualquer forma comunicativa que se pretenda organizada e que pretenda de fazer corresponder a um só logos uma só aletheia . A única "realidade" é aquela das evidências objectuais, mas que não têm nada da elevadora fixidade do "correlativo objectivo" eliotiano, mas sim uma consistência, ao mesmo tempo epifánica e misteriosa, de certas figuras beckettianas ou ionesquianas ou, ainda melhor, por uma espécie de afinidade artístico-intelectual subterrânea e alusiva (mas nem tanto), àquel sentimento da existência que de Gogol chega até Cechov (seria possível individualizar, ainda, uma outra linha de influência, desta vez francesa, em Lobo Antunes, tão relevante e incisiva, a que de Flaubert chega a Céline). A relação entre objecto e coisa, o espaço "loico" que intercorre entre um objecto e a sua definição, torna-se assim, signo inequívoco, ao mesmo tempo, de uma possibilidade e de uma impossibilidade: assim, por exemplo encontra expressão a indizível terribilidade, no manicómio, da união entre solidão, silêncio e abandono na forte, presentíssima presença dos odores, quase que o único correspondente possível da dissolução da alma ou do sujeito seja o seu odor, o odor da sua estagnação-putrefacção. Como se acenou precedentemente, então, no espaço da reclusão manicomial, reclusão física como metafísica, a dimensão teatral, de quinta teatral, do lugar constitui uma espécie de limbo, onde não existe espera, mas onde, se espera sempre, pois é o único lugar onde essa espera, essa tensão , não seja totalmente insensata, isto é, onde a espera não é fé, e por isso uma redenção, mas pelo menos uma esperança, uma abertura. A loucura, isto é, se pense a Torquato Tasso, a Antonin Artaud, a Luigi Pirandello, a Anton Cechov, como prisão da alma. E, poderíamos acrescentar com Lobo Antunes, alma da prisão, "a inumana máquina concentracionária do hospital" 30 .

Outro tema fundamental, profundamente ligado ao preceden­te, é a visão do tempo e a relação entre tempo contínuo e tempo fraccionado 31 pois "o tempo não se segmenta em horas como uma régua em centímetros mas possui a textura contínua que confere à vida intensidade e profundez inesperadas" 32 (note-se a afinidade entre "textura" e "texto"), ainda se, algumas vezes, é mesmo a imobilidade do tempo, o tempo petrificado do calendário, outra antiga e passada forma, modalidade da memória, a determinar a recordação, o caminho da memória como uma "peregrinação desencantada, e procurava sem sucesso reconstruir dias de que conservava uma memória de felicidade difusa diluída num sentimento uniforme de bem estar doirado pela luz oblíqua das esperanças mortas" 33 .

O tempo não é, portanto, um fluxo único, não existe linearidade do tempo, senão como, proustianamente e drummondianamente, dissolução, mas existe um entrelaçar-se contínuo e desesperador do tempo como simultaneidade de planos indiferentes , eis a verdadeira dramaticidade da consciência e da visão, do tempo como imprevista revelação de si pela perda de si mesmo. Assim, na logocronia infinita da escrita-loucura-normalidade, o tempo mítico pode tornar-se tempo pessoal e o tempo individual-singular pode parecer, mas parecer só por um instante, como tempo absoluto (não é uma epifania, mas sim um escondido aparecer, a sombra daquela epifania). Assim, o que se revela, o que vive na própria evidência é este infinito sentimento da separação e da queda, o sentido contínuo da queda, beckettiana e cechoviana; a continuidade regelante entre seres humanos e animais, animais antigos e rugosos - as tartarugas os elefantes - animais rugosos como rugoso é o tempo; ou, ainda, a visão-evidência de África como lugar de ausência, daquilo que é e está longe [longitude, afastamento??] do que é próprio, o lugar do absoluto outro de si .

Contraposta, assim, à vazia evidência nomenclatória das palavras, "para o psiquiatra o manuseio das palavras constituía uma espécie de vergonha secreta, obsessão eternamente adiada" 34 , está a figura da mãe, "herdei talvez de ti o gosto do silêncio." 35 , a recordação da mãe, que pela sua vez é forma da consciência da condição de "solitários ainda quando não sós, irremediavelmente separados pelo infinito da desesperança" 36 . O sentido, poderíamos dizer, ainda melhor, o sentimento da memória é uma "sensação de existir apenas no passado e de os dias deslizarem às arrecuas como os relógios antigos, cujos ponteiros se deslocam ao contrário em busca dos defuntos dos retratos, lentamente aclarados pelo ressuscitar das horas" 37 , em que os lugares que constituem a "terra da memória" mudam por meio do olhar do mesmo sujeito que mudou, no tempo da viagem e do regresso 38 ,

 

[...] seduzido por um continente onde até a morte possuía a impetuosa alegria de um parto triunfal. Entre a Angola que se perdera e a Lisboa que não reganhara o médico sentia-se duplamente órfão, e esta condição de despaisado continuara dolorosamente a prolongar-se porque muita coisa se alterara na sua ausência, as ruas dobravam-se em cotovelos imprevistos, as antenas da televisão espantavam os pombos na direcção do rio obrigando-os a um fado de gaivotas, rugas inesperadas confe­riam à boca das tias expressões de Montaignes desiludidos, a multiplicação dos eventos familiares empurrava-o para a pré-história do folhetim de que dominava apenas os acidentes paleolíticos. 39

O tempo passado torna-se numa matéria magmática e fugidia, em que o sentimento da perda une-se com aquele do afastamento, como, por exemplo, acontece na relação-visão com as filhas, com a dilacerante condição de separação delas, da terrível condição de poder somente vê-las crescer e através desse acto, que é revelação de uma impossibilidade, tomar consciência da evidência do tempo negado-perdido:

 

Podia apenas, durante a semana, espreitá-las às ocultas como um espião, ser o José Matias de duas Elisas irremediavelmente perdi­das, que prosseguiam trajectos divergentes do seu, pequeninas parcelas do seu sangue que acompanhavam, dilacerado, e uma distância cada vez maior, 40

 

ou então, como foi definida num outro passo, "a angustiosa aprendizagem de estar vivo" 41 . A forma concreta da memória, então, pode apresentar-se como um sentimento ancestral e animal, incarnado, realmente feito carne , na figura, simbólica e concreta ao mesmo tempo, do elefante, uma espécie de metonímia/antono-másia.

 

[...] que estranha mecânica interna rege isto tudo, pensou ele, e que subterrâneo fio condutor une frases desconexas e lhes confere um sentido e uma densidade que me escapam? Estaremos no limiar do silêncio como em certos poemas de Benn, em que as frases adquirem peso insuspeitado e a significação a um tempo misteriosa e óbvia dos sonhos? Ou será que como Alberti sinto esta noite, feridas de morte, as palavras, e me alimento do que nos interstícios dela cintila e pulsa? Quando a carne se trasforma em som aonde a carne e aonde o som? E aonde a chave que possibilite descodificar este morse, torná-lo concreto e simples como a fome, ou a vontade de urinar, ou ânsia de um corpo? Abriu a boca e disse:

- Tenho saudade da minha mulher. 42

Vem continuamente usado o jogo alusivo e "deslizante" do reenvio artístico ou da intertextualidade 43 , ao qual nunca se dá um sentido de elevação, de projecção da simples materialidade, mas aquele de uma inevitável cadeia de percepções, que altera (pois é já alterada) a priori qualquer sentido, e da qual é impossível libertar­se. É como se o mundo fosse fechado numa rede de reenvios, não correspondências de tipo baudelairiano, mas de refracções de tipo joyciano, as quais não revelam até mesmo um puro sentido arcano, mas velam e recobrem de um frágil véu de hipocrisia e verdade o mundo das coisas outras, o mundo fora do sujeito, o mundo do presente. É, de facto, Memória de elefante , um romance que se passa todo no presente, num só dia, mas no qual parece não existir outro que o passado e um futuro, feito de obsessões. Assim, depois dos silêncios antigos e íntimos da lentidão da tartaruga e da imensidão do elefante, alarga-se, o "sentimento do mundo" à gaivota cechoviana, da qual, por excesso e reconhecimento aparece no texto até mesmo uma frase do escritor russo ("aos homens oferece-lhes homens, não te ofereças a ti mesmo" 44 ) e uma total e ineludível identificação: "aquela gaivota sou eu e quem foge de eu sou eu também" 45 . E, um pouco mais à frente, no diálogo/monólogo inevitável e impossível com a mulher perdida, o protagonista afirma:

[...] os versos desse Dylan Thomas de que tanto gostavas

In the final direction of the elementary town
I advance for as long as forever is.

E o médico imaginou-se a cabecear numa carruagem deserta, duplicado do outro lado do vidro através de casas, fragmentos de muralha e luzes de navios, ao ritmo das palavras do poeta que a mulher costumava transportar consigo para a cama e com quem mantinha um diálogo silencioso e perfeito que o excluia:

for the lovers
Who pay no praise or wages
Nor heed my craft of art
46 .

"Tempo, somos feitos de tempo. É a única coisa que temos, enquanto a perdemos" - poderia dizer o coelho de Alice. "[...] como eu, acrescentou o psiquiatra, ao mesmo tempo a fugir e à procura em sucessivos círculos sem finalidade e sem fim" 47 ; ou ainda: "Tempo, repetiu o médico, necessito imperiosamente de tempo para me vestir de coragem, colar todos os meus ontens no álbum de retratos [...]" 48 , até à frase final, àquela consciência de uma debilidade, de uma fragilidade, mas que quando dita, quando declarada através da escrita, torna-se, certamente não uma força ou não menos obscura, mas, talvez, menos alheia: "podes achar idiota mas preciso de qualquer coisa que me ajude a existir" 49 .

É uma viagem através do dia e da noite, um dia e uma noite, do dia alheio ao ser alheio da noite, uma viagem sonambólica e desesperadora entre um princípio que acabou para sempre e um fim que não terminou nunca. Como num espelho. Como a imaginação de uma personagem literária que atravessa um espelho, e torna-se espelho e torna-se si mesma.

 

Notas de Rodapé

 

1 "Le rappresentazioni antiche del Tempo rilevano due giovani figure contrapposte: Kairòs e Aion. Kairòs è nudo, di profilo, in cammino, ha le ali alle spalle e ai piedi e tiene in mano una doppia bilancia, in equilibrio sulla lama di un rasoio; la sua testa è calva, salvo un ciuffo da cui lo si può afferrare: è il 'Momento Giusto', l'attimo felice e decisivo. Aion è invece il divino principio creatore; eterno, immoto e inesauribile: bel ragazzo alato, diritto, frontale, avvolto nelle spire di un serpente, ha volto ora umano, ora leonino. Il serpente trattiene la sua poderosa energia ell'immobilità vibrante della creazione." (G. Bompiani, Tempora, Milano, Anabasi, 1993, p. 91 e passim.) " Si tratta in definitiva di osservare come, grazie alla nuova funzione dello schermo, l'opposizione 'soggetto-altro da sé' venga sostituita da quella 'soggetto-soggetto' [.] La scena del vetro e quella dello specchio risolvono infatti la domanda sull'identità (sia essa mediata da un modello fallace o assunta direttamente in prima persona) sulla base di strutture mutuate dall'ottica." (V. Magrelli, Vedersi vedersi: modelli e circuiti visivi nell'opera di Paul Valéry, Torino, Einaudi, 2002, p. 67.)

2 " Ciò di cui abbiamo bisogno, è uno schema a tre livelli - enunciazione-enunciato-mondo del testo - ai quali corrispondono un tempo del raccontare, un tempo raccontato, una esperienza di finzione del tempo progettata mediante la congiunzione/disgiunzione tra tempo usato per raccontare e tempo raccontato ." (P. Ricoeur, Tempo e racconto : la configurazione nel racconto di finzione, Milano, Jaca Book, 1987, p.127.

3 António Lobo Antunes, Memória de elefante , 19. ed., Lisboa, Dom Quixote, 2000, p. 11. Daqui em diante, sempre indicado como MDE.

4 A referência ao pensamento de Michel Foucault é, aqui, naturalmente obrigatória e ineludível. " Il passato si manifesta perciò in due modi: sciolto nella sua ricodificazione entro nuovi sistemi di segni o incapsulato nello spazio scavato dell'evento traumatico. [.]La biografia di ognuno nasconde immancabilmente qualcosa: la si vede sempre di profilo, mai di faccia. " (R. Bodei, Le logiche del delirio : ragione, affetti, follia, Roma-Bari, Laterza, 2000, p. 6-7). " Si tratta di correre il rischio di avvicinarci il più possibile alla "luce nera" o alla soglia dell'insensato, sapendo però che ogni gesto filosofico è un rimpatrio e per di più precipitoso. La capacità di tale ritorno sembra allora misurarsi sulla capacità di esposizione alla "folle audacia" del pensare, in un gioco di andata e ritorno che più tardi Derrida avvicinerà al gioco del rocchetto (di cui Freud parla in Al di là del principio di piacere). Questa follia, che ha a che fare con il gioco rischioso della presenza e dell'assenza, non solo non viene mai cancellata, ma è anzi il terreno indispensabile a ogni pensiero che si spinga al suo limite: cioè, per ogni pensiero che non ripeta semplicemente un altro pensiero o il pensiero di un altro. Per Derrida questo terreno è la posta in gioco più importante " (P. A. Rovatti, La follia, in poche parole , Milano, Bompiani, 2000, p.16).

5 MDE, p. 13 (grifo meu).

6 Id., ibid., p. 14.

7 MDE, p. 16-7.

8 Id., ibid., p. 18.

9 Id., ibid.

10 "Pero el límite debe pensarse (frente a Hegel) en forma afirmativa, como limes; o como espacio y lugar susceptible de ser habitado. Constituye una franja etrecha y frágil, un istmo. Pero en ese margen hay espacio suficiente para implantar la existencia" (E. Trías, La razón fronteriza , Barcelona, Destino, 1999, p. 47.) " La prima funzione è quella di collocare l'intera speculazione sul tempo entro l'orizzonte di una idea-limite che obbliga a pensare insieme il tempo e l'altro dal tempo. La seconda funzione è quella di intensificare sul piano esistenziale l'esperienza stessa della distentio. La terza funzione è quella di chiamare questa stessa esperienza a superarsi in direzione dell'eternità, e quindi a gerarchizzarsi interiormente, contro il fascino per la rappresentazione di un tempo lineare. " (P. Ricoeur, Tempo e racconto , Milano, Jaca Book, 1986, p. 43-4.)

11 MDE, p. 20.

12 Id., ibid., p. 21. Pouco mais adiante se falará de "lupa psicanalítica". (p. 28).

13 "[.] mostrare che l'hors-texte, ciò che è fuori del testo, è anche dentro il testo, si annida tra le sue pieghe: bisogna scoprirlo e farlo parlare. [.] Per 'spazzolare la storia a contropelo' [.] come esortava a fare Walter Benjamin, bisogna imparare a leggere le testimonianze contropelo, contro le intenzioni di chi le ha prodotte. Solo in questo modo sarà possibile tener conto sia dei rapporti di forza sia di ciò che è ad essi irriducibile." (C. Ginzburg, Rapporti di forza: rapporti, retorica, prova, Milano, Feltrinelli, 2000, p. 46-7.)

14 MDE, p. 25.

15 MDE, p. 27. 16 Id., ibid., p. 29. 17 Id., ibid., p. 30. 18 Id., ibid., p. 32.

19 MDE, p. 33. 20 Id., ibid., p. 39. 21 Id., ibid., p. 42.

22 MDE, p. 42-43.

23 " La violenza agisce già prima della ferita. Una minaccia acuta e potente frantuma le forme della coscienza spazio-temporale. All'improvviso il mondo con cui si aveva familiarità si trasforma in incertezza, ogni cosa è capovolta. È come se ad un tratto si spalancasse una voragine: il mondo non offre più terreni sicuri, né protezione né riparo. Eppure non ci sono vie d'uscite. La paura attanaglia la propria vittima. Non è l'essere umano ad avere paura, è la paura ad avere lui. Non è determinante se egli sia effettivamente rinchiuso in una cella. Dove imperversa la paura, il mondo si contrae allo spazio immediatamente circostante. Chi è assalito dalla paura è relegato nel punto in cui si trova. Vuole sfuggire al pericolo, ma non può: l'impulso alla fuga è bloccato. Infatti la paura non altro che questo antagonismo tra paralisi e fuga. Mette l'uomo in catene mentre scatena il caos nella sua prigione interiore. Egli vacilla, è assalito dalle vertigini, il mondo è sconvolto, l'ordine delle cose distrutto. Ciecamente le mani si protendono alla ricerca di un appiglio. Ma quanto più forte si aggrappa, tanto minore è il sostegno che trova. Non potendosi più rivolgere verso l'esterno, la paura rigetta la sua vittima su se stessa. Blocca la sua spinta al movimento, il suo impulso alla fuga. Il corpo trema, si dibatte nel tentativo di uscire. La paura è molto più che un moto dell'anima: la sciagura fa tremare il corpo, lo scuote di spasmi. La paura inchioda l'essere umano allo hinc et nunc. " (W. Sofsky, Saggio sulla violenza , Torino, Einaudi, 1998, p. 57.)

24 Cf. F. Jameson, "Romance e reificazione: costruzione degli intrecci e chiusura ideologica". In: Joseph Conrad, in Id., L'inconscio politico: il testo narrativo come atto socialmente simbolico , Milano, Garzanti, 1990, p. 257-352; J. de Melo (org.), Os anos da guerra . 1961-1975. Os portugueses em África : crónica, ficção e história, 2. ed., Lisboa, Dom Quixote, 1998; M. G. Simões - R. Vecchi (a cura di), Dalle armi ai garofani: studi sulla letteratura della guerra coloniale , Roma, Bulzoni, 1995.

25 MDE, p. 43.

26 " L'essere, il mondo, l'aperto non sono, però, qualcosa di altro rispetto all'ambiente e alla vita animale: essi non sono che l'interruzione e la cattura del rapporto del vivente col suo disinibitore. L'aperto non è che un afferramento del non-aperto animale. L'uomo sospende la sua animalità e, in questo modo, apre una zona "libera e vuota" in cui la vita è catturata e ab-bandonata in una zona di eccezione. " (G. Agamben, L'aperto : l'uomo e l'animale, Torino, Bollati Boringhieri, 2002, p. 81.)

27 MDE, p. 46. 28 Id., ibid., p. 47. 29 Id., ibid., p. 48.

30 MDE, p. 51.

31 "Il fatto è che, al di là di questo stesso oggetto, ne va di un'ambivalenza intrinseca al rapporto delle cose, per l'uomo, con il tempo. Il tempo consuma le cose e le distrugge, vi produce guasti e le riduce inservibili, le porta fuori moda e le fa abbandonare; il tempo rende le cose care all'abitudine e comode al maneggiamento, presta loro tenerezza come ricordi e autorità come modelli, vi imprime il pregio della rarità e il prestigio dell'antichità. La bilancia fra questo positivo e questo negativo, instabile e imprevedibile, obbedisce anche a dosaggi per così dire quantitativi. Il tempo logora o nobilita, logora e nobilita le cose; e di fatto una cosa può sia essere troppo logorata dal tempo per venirne ancora nobilitata, che esserlo ancora troppo poco all'identico fine. " (F. Orlando, Gli oggetti desueti nelle immagini della letteratura : rovine, reliquie, rarità, robaccia, luoghi inabitati e tesori nascosti, 2. ed., Torino, Einaudi, 1994, p. 15.)

32 MDE, p. 51. 33 Id., ibid., p. 52.

34 MDE., p. 67.

35 Id., ibid., p. 70.

36 Id., ibid., p. 85.

37 Id., ibid., p. 91.

38 "Se quindi ci chiediamo a che cosa sono affidati sia l'intervallo fra il prima e il poi dell'evento sia la sua irrevocabilità (affidati per essere custoditi, e infatti qualora non lo fossero la libertà precipiterebbe nella necessità) dovremo rispondere: al tempo e alla memoria. 'Ecco perché con la libertà comincia il tempo ed ecco perché l'irrevocabilità degli atti liberi ha come sede la memoria'" (S. Givone, Eros/ethos, Torino, Einaudi, 2000, p. 72.)

39 MDE, p. 98-9. 40 Id., ibid., p. 105. 41 Id.,bid., p. 109. 42 MDE, p. 138-9.

43 " In letteratura il problema della compresenza di livelli di enunciazione si propone anche sotto altra forma, dà luogo a ciò che viene definito 'intertestualità', o 'dialogismo intertestuale'. Si intende per ciò quel fenomeno culturale-letterario concernente i rimandi che in un testo vengono fatti ad altri testi; anche se più comunemente inda­gata nell'ambito della narrativa, l'intertestualità può riguardare anche le arti figura­tive, e, come recenti studi mettono in luce, il cinema e la televisione. Eco considera il dialogismo intertestuale una forma particolare di 'ripetizione': in essa il lettore viene sollecitato non tanto a godere dell'identico, come in altre forme di ripetizione, ma piuttosto del meccanismo stesso che fa dell'identico il diverso ( come forma estrema, paradossale di coincidenza tra il totalmente identico e totalmente diverso si può ricordare Pierre Menard, autore di Chisciotte di Borges. )" (M. Mizzau, L'ironia : la contraddizione consentita, 4. ed., Milano, Feltrinelli, 1994, p. 62.)

44 MDE, p. 160. 45 Id., ibid., p. 161.

46 MDE, p. 163-4 (grifo meu).

47 Id., ibid., p. 167.

48 Id., ibid., p. 172.

49 Idem, p. 188.